Pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP) estão alertando para o crescimento de uma “epidemia silenciosa” de dependência química na população idosa. O fenômeno, muitas vezes invisível para famílias e para o sistema de saúde, é impulsionado pelo consumo abusivo de álcool e, principalmente, de medicamentos prescritos, como os benzodiazepínicos (calmantes).
Segundo o estudo, fatores sociais como a solidão, a aposentadoria, a perda de entes queridos e a diminuição da autonomia criam um ambiente propício para que o uso de substâncias se torne uma válvula de escape. A situação é agravada pela medicalização excessiva da velhice, onde sintomas como insônia ou ansiedade são frequentemente tratados com remédios que podem levar à dependência.
A professora Tania Sassone, do curso de Gerontologia da Escola de Artes, Ciências e Humanidades (EACH) da USP, destaca que o problema é subnotificado. “Há uma dificuldade em identificar o abuso de substâncias em idosos, pois os sintomas podem ser confundidos com os de outras doenças crônicas ou com sinais do próprio envelhecimento”, explica.
Álcool e remédios são os principais vilões
O álcool continua sendo a substância mais consumida, muitas vezes de forma socialmente aceita, o que mascara o início da dependência. Já os medicamentos benzodiazepínicos, utilizados para tratar ansiedade e insônia, representam um risco ainda maior devido à facilidade de acesso por meio de prescrições médicas. O uso prolongado desses remédios pode causar declínio cognitivo, aumentar o risco de quedas e criar uma forte dependência física e psicológica.
O estigma social é outra barreira significativa. A imagem do dependente químico raramente é associada a uma pessoa idosa, o que dificulta que eles próprios ou suas famílias busquem ajuda. “A sociedade não espera ver um idoso como dependente químico, e isso contribui para a invisibilidade do problema”, afirma Sassone.
Os especialistas reforçam a necessidade de políticas públicas específicas, maior treinamento para os profissionais de saúde e, sobretudo, mais atenção da sociedade e das famílias para os sinais de alerta. Abordar o problema com empatia, sem julgamento, e fortalecer os vínculos sociais e afetivos são passos fundamentais para combater essa epidemia silenciosa.